Sobre os órgãos de tubos - II

Por Júlio Amstalden

A postagem deste domingo segue o tema iniciado na semana anterior: os órgãos de tubos no Brasil. O texto anterior terminava com a citação de organeiros que trabalharam no país na primeira metade do século XX. O artigo de hoje mostra um pouco da biografia de um deles: Carlos Möhrle

Carlos Egon Möhrle nasceu em 01/05/1904 em Öberlingen, cidade ao sul da Alemanha, no estado de Baden-Würtemberg. Após seus estudos básicos, ingressou com 16 anos como aprendiz na Walcker, uma importante firma alemã de construção de órgãos. Fez toda a sua formação como organeiro nesta empresa. Costumava ser então enviado para montar órgãos da Walcker em vários países. Numa dessas ocasiões, em 1930, foi enviado para o Brasil, onde o franciscano Pedro Sinzig, importante ativista da música sacra no país, o convidou para trabalhar no órgão do Convento Santo Antônio, no Rio de Janeiro. Möhrle aceitou e, juntamente com outro organeiro alemão, Guilherme Berner, trabalhou  na construção daquele instrumento.

Por razões que não são muito conhecidas, Möhrle decidiu mudar-se para o estado de São Paulo, indo residir na capital. Chegou em 1932, em plena Revolução Constitucionalista. Seu início no estado foi difícil, devido à revolução, mas logo os franciscanos encomendaram a ele um órgão grande, com três teclados, para o Convento Santo Antônio, no bairro do Pari. Acabado este trabalho, Möhrle começou a receber encomendas de outros instrumentos, tanto na capital quanto no interior do estado. Era chamado também para fazer manutenções.

No início, Möhrle desejava apenas passar um tempo no Brasil, pois era jovem e desejava fazer aqui o seu pé-de-meia, para retornar à sua Alemanha natal. No entanto, a eclosão da II Grande Guerra alterou os seus planos, bem como seu interesse por uma brasileira o fez repensar a decisão de voltar. Casou-se com Dulce Gomes, paulistana de nascimento, e por aqui permaneceu.

Os pedidos de construção de novos órgãos continuaram. Möhrle associou-se a dois outros alemães imigrados: Gustav Weinsserieder e Paul Schönborn. Os três eram organeiros com formação pela Walcker e, juntos, passaram a construir muitos dos instrumentos que existem no estado de São Paulo. Costumavam levar toda a maquinaria para o local da construção, pois achavam que os órgãos deviam ser levantados no mesmo local onde permaneceria. Um costume curioso, pois tradicionalmente os órgãos são montados em oficinas e posteriormente transportados ao seu local de instalação.

Os alemães que residiam no Brasil foram perseguidos durante a época da II Guerra. Em geral eram presos ou até mesmo espancados, como parte da política dúbia de Getúlio Vargas em relação ao nazismo. Por essa razão, Möhrle desistiu de construir seus órgãos diretamente nas igrejas, pois nesse sistema era obrigado a passar meses fora de casa, exposto aos perigos. Mudou-se então para Jundiaí, onde fundou uma firma de construção de órgãos. Ficava assim mais próximo do interior e perto da capital, evitando os perigos de grandes ausências fora de casa.

Mörhle construiu órgãos em São Paulo, Santos, Jundiaí, Campinas, Piracicaba, São Carlos, Jaú, Pindamonhangaba e Itatiba, mas também no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Faleceu em 1973, enquanto trabalhava na construção de um órgão em Pindamonhangaba. Está sepultado na Catedral de Santos.


(Foto: órgão Möhrle do Convento Sto. Antônio do Pari, São Paulo. Autor: Carlos Nascimento)

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